sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

SINTRA


A fresquidão dos bosques frondosos,
O murmúrio das águas a escorrer nas encostas,
O canto das fontes a embalar os amantes,
E o sussurro das folhas ao ritmo da aragem mansa.

O trinar dos pássaros,
Os aromas da terra
E a paleta das cores,

As neblinas perpétuas a sugerirem mistérios
E lendas de fadas e faunos correndo nos bosques.

Os penhascos gigantes a sustentar o castelo,
O palácio nascido do sonho de um rei,
E o convento talhado na rocha a falar-nos de Fé.

O romantismo, o romance, os passeios de mãos dadas,
E por fim, o beijo sonhado, num cenário de idílio.

E lá no alto, a lua, a coroar o monte.

Guilherme Duarte

UMA ESTRELA ESPECIAL


Neste cantinho escondido
Do parque fresco e frondoso
Que há muito tempo acolheu,
E escondeu o nosso amor
Dos olhares menos discretos,
Parece que o tempo parou.

O mesmo banco de pedra
Salpicado pelo musgo,
À sombra do castanheiro.
O canto da água da fonte
Continua a ser o mesmo
Que embalou os nossos beijos.
E as folhas do arvoredo
Afagadas pela brisa
Continuam sussurrando
Os mesmos sons embaladores.

As cameleiras são ainda
Aquelas que há meio século,
Floridas,
Enfeitaram o romance
Que nós dois aqui escrevemos.

Os fetos e as avencas,
O cantar da passarada
O aroma das flores,
São os mesmos doutros tempos.

Nada mudou.

Nada mudou? Mudou tudo!

Hoje estou aqui sentado,
Sozinho, velho, enrugado.
Sem ter aqui a meu lado
O teu corpo escultural,
A tua cara bonita,
O sorriso jovial
Com que acolhias, feliz,
As minhas juras de amor.

Já não tenho a oferecer-se-me
A tua boca sedenta.
Não sinto já os teus lábios
Doces, carnudos, sedosos
A colarem-se contra os meus,
Nem os teus seios generosos,
Rijos, firmes e empinados,
Parecendo ser desenhados
Perfeitamente à medida
Da palma da minha mão.

Neste cantinho pacato
Do encanto doutros tempos.
Só resta agora a saudade.

Se vim hoje até aqui,
Sentar-me no nosso banco,
Neste recanto do parque
À sombra do castanheiro,
Foi apenas para lembrar

O passado já longínquo.
Não me interessa se ouço passos,
Se há alguém a aproximar-se,
Se há mirones a espreitar.

Estou agora aqui sozinho,
Pensativo e melancólico
Apenas para recordar
Os tempos felizes de outrora.

Nada mudou por aqui,
Mas tudo mudou em mim.

Onde quer que tu te encontres
Será que ainda recordas
Este banquinho de pedra
À sombra do castanheiro,
Neste cantinho escondido
Do parque fresco e frondoso
Que acolheu o nosso amor
Já lá vão cinquenta anos?
Talvez tudo o que vivemos
Tenha já sido apagado
Do livro das tuas memórias
Pela voragem do tempo.

Talvez!

Mas eu hoje aqui sentado
Recordo com muita saudade
Cada beijo que trocámos,
E cada jura que fizemos
Neste banquinho de pedra.

Obrigado velho amigo
Por teres guardado segredo
E não teres dito a ninguém
Tudo aquilo que aqui viste.

Castanheiro, muito obrigado
Por manteres ainda guardado
No teu tronco centenário
Os corações que gravámos
Por cima dos nossos nomes.

Enquanto eu envelheci
E vivo olhando o passado,
Tu, velho banco,
Continuas a acolher,
E a esconder neste cantinho
Todos os dias, novos amantes,
Novos beijos,
Novas juras,
Novas promessas de amor
P´ra durar a vida inteira.
Daqui a cinquenta anos
Muitos daqueles que agora
Se acolhem aqui nos teus braços,
Voltarão tristes e sós
Apenas para recordar
Tudo aquilo que viveram
Neste recanto de idílio.

E tu,
Como sempre acolhedor,
Cá estarás para os receber
E alimentares-lhes a saudade
Como fazes hoje comigo.

Obrigado companheiro.
Voltarei a visitar-te
Para juntos recordarmos
Os tempos felizes de outrora.
E agora,
É já tempo de ir embora,
Que há ali um parzinho
À espera que fiques vago.

Trata-os bem meu bom amigo,
Como fizeste comigo
Há muitos anos atrás.

GD




UMA ESTRELA ESPECIAL


Entre milhões de estrelas cintilantes
Que bordam de luz e prata o firmamento
Há uma em cujo brilho mais me atento
Por me lembrar um sorriso que vi antes.

É um pontinho luminoso, tão distante,
Minúsculo, mas com um brilho tão intenso
Que rasga a escuridão do céu imenso
Para me  envolver com a sua luz brilhante.

Essa estrela, essa luz e essa paz,
E o sorriso sereno que me traz
São o reacender de um farol que se apagou.

Eu sei mãe que lá no céu, tu não me esqueces,
E , junto a Deus, são agora as tuas preces

Os beijos que a tua ausência me roubou.


Guilherme Duarte

FOLHAS CAÍDAS



Estas folhas espalhadas
Pelo chão do meu jardim
São os meus sonhos falhados,
As perspectivas goradas,
As metas nunca alcançadas
E todos aqueles sonhos
Que em tempos acalentei
Mas nunca realizei,
E que terminaram assim.

Daquela árvore frondosa
Que deu sombra à minha esperança,
As folhas foram caindo
Uma a uma sem parar.
E em cada folha que cai
Há um sonho que se vai,
E uma paixão que se extingue.
Em cada folha que amarelece
Há uma vida que enfraquece
E uma força que se esvai.
E quando essa folha cai
É uma página que se rasga
Do livro da minha história,
E no fim fica a memória,
E tem um nome: saudade.

Aquela árvore frondosa
Que já foi verde e viçosa,
Hoje de folhas despida,
Já não dá sombra a ninguém.
Está agora feia e nua
E está caduca, também,
A árvore da minha vida.

Guilherme Duarte


QUANDO O FAROL SE APAGOU


 Escureceu subitamente,
E eu fiquei só.
Estou com medo, mãe,
Com muito medo.
Tu sabes como a escuridão me assusta
E o receio que tenho de estar sózinho.
Abraça-me, mãe.
Aperta-me nos teus braços
Afaga-me os cabelos,
Beija-me,
E canta-me uma canção.
Era assim que afastavas o meus sustos de criança
Enquanto o sono não chegava.
 Aconchegavas-me a roupa da cama.
Depois um beijo e um sussurro:
“Boa noite, meu amor.
Dorme um soninho tranquilo.”

Lembras-te?
Claro que lembras.
Como podias esquecer?

Ainda há pouco me contavas o teu dia,
Enquanto o sol descia lentamente no horizonte
A dourar o entardecer.
Disseste que não estavas bem.


E de repente, ficou escuro,
Muito escuro.
Depois, o silêncio.

Fiquei só e tive medo.

Mãe
Não vás.
Não me deixes aqui sozinho
Com a escuridão à minha volta.
A  luz do farol que orientou a minha vida.
Apagou-se subitamente
E eu sinto-me perdido.
Chamo-te, mas não respondes.
Estás serena, mas imóvel.
Não me falas, nem me ouves.
Adormeceste.

Aconcheguei-te a roupa
Como sempre me fizeste.
Abracei-te, mas não senti o aperto dos teus braços.
Beijei-te, mas, pela primeira vez, não retribuíste.
Os teus dedos não procuraram os meus cabelos como dantes.
Quis cantar-te uma canção, mas a voz atraiçoou-me.
Já dormias.
Serenamente.
Com a mesma serenidade que sempre te acompanhou
Ao longo da tua vida. 


Entre lágrimas sussurrei:
Boa noite querida mãe,
Dorme um soninho descansado.

Mãe,
Estou assustado e tenho medo.
Sem ti, a criança que me mantive até hoje,
Deixou de fazer sentido. Partiu contigo.
E eu não sei viver sem ela
.

Guilherme Duarte

 (10 de Setembro de 2009)



O LUGAR DOS POETAS

São as névoas perpétuas
Que cobrem a serra
Que o poeta procura
Quando a poesia se ausenta
E o poema não nasce.

Quando a musa se afasta,
E  já poeta não é,
É à magia da serra
Que o poeta recorre .

É entre as brumas que envolvem o  monte
Que as musas se escondem.
O poeta sabe onde estão e vai procurá-las.

No silêncio do bosque o poeta sonha.
Vê, musas, vê deusas, vê fadas
Que  cantam e dançam,
Cobertas apenas por diáfonos véus
Que lhes cobrem o corpo sem tapar a nudez.
O poeta, aproxima-se e dança com elas.

É então que a poesia regressa e o poema flui.

Tinha razão o poeta em confiar na magia da serra.
É ali, entre musas, deusas e fadas
Que é o lugar dos poetas.


Guilherme Duarte

APSENTAÇÃO DE LIVRO DA ZÉLIA CHAMUSCA

segunda-feira, 30 de junho de 2014

SETE PONTIFICADOS


          
De Pio XII ao Papa Francisco são já sete os Papas que conheci ao longo das sete décadas que levo de vida. Sete Papas, sete pontificados, sete estilos diferentes, sete personalidades distintas. Homens com origens, percursos e experiências de vida diferentes que os conduziram a um destino comum, a cadeira de S. Pedro. Não resisti à tentação de tentar estabelecer uma comparação entre todos estes Papas e os seus pontificados. Não é um exercício fácil de fazer pelo menos para quem, como eu, não possui os conhecimentos suficientes e necessários para o conseguir. O mediatismo que os rodeou não foi igual para todos eles, o mundo tem mudado de forma alucinante nestas últimas décadas e os problemas com que eles se viram confrontados tiveram certamente contornos muito diferentes. Resultado? Desisti de fazer comparações que não terão qualquer cabimento. A verdade é que todos eles, com a ajuda do Espírito Santo, cumpriram a missão que lhes foi confiada com total dedicação, competência, humildade e sentido de serviço a Deus e ao mundo e fizeram-no com uma Fé inabalável procurando com o seu exemplo dizer aos crentes, e porque não dizê-lo, também aos não crentes, que a santidade não é exclusivo de alguns eleitos por Deus mas está ao alcance de todos nós. Assim nós o queiramos. É fácil vivermos em santidade? Não, não é, mas também não é impossível. Os exemplos que a Igreja nos oferece são muitos e elucidativos.

Estive tentado a escrever um pouco sobre a marca que cada um destes sucessores de S. Pedro deixaram na minha vida mas o espaço de que disponho é limitado e insuficiente para expressar todas as emoções que eles me transmitiram. Optei então por destacar apenas quatro deles, aqueles que mais mexeram comigo e certamente com a maioria dos cristãos, S. João XXIII, João Paulo I, S. João Paulo II e o actual Papa Francisco. Gostaria numa próxima oportunidade de falar um pouco sobre Pio XII, Paulo VI e Bento XVI pela importância que também eles tiveram na vida da nossa Igreja, mas por agora prefiro destacar a imagem de bondade que João XXIII nos transmitia e a decisão firme que tomou de aproximar a Igreja dos fiéis ao convocar o Concílio Vaticano II. João Paulo I no seu curto pontificado de um mês conquistou o mundo com a sua humildade e o seu sorriso, o sorriso de Deus como consta do título de um filme italiano realizado sobre a sua vida. Sucedeu-lhe João Paulo II que trouxe à Igreja a força da personalidade de um homem temperado pelo flagelo da guerra, pela crueldade nazi e pela luta contra a ditadura comunista. Se João XXIII aproximou os fiéis à Igreja, João Paulo II levou a Igreja até aos fiéis quando se deslocou aos quatro cantos do mundo com a missão de levar a mensagem de Cristo a todos os lugares por mais recônditos que fossem. Cativou a juventude e foi o principal responsável pela queda do comunismo na Europa, pelo derrube do muro de Berlim e o fim da União Soviética. Soube usar como nenhum outro a comunicação social para difundir a palavra missionária. O seu poder e a sua força inabalável valeram-lhe um atentado congeminado pelos dirigentes comunistas do Leste europeu, atentado esse que num dia 13 de Maio lhe custaria a vida se não fosse a intervenção miraculosa de Nossa Senhora que ele tanto amava e a quem entregou a sua vida ao ponto de adoptar como lema do seu pontificado, “Sou todo Teu, Maria”. Tinha razão Karol Wojtyla quando pediu aos fiéis de todo o mundo para não terem medo. Houve porém alguém que começou a ter medo nesse preciso momento, os algozes comunistas que oprimiam meia Europa. E o futuro demonstrou que tinham toda a razão para o ter.

Actualmente a cadeira Petrina está ocupada por um homem que veio de longe, do fim do mundo como ele disse quando acabado de ser eleito pelo conclave se dirigiu aos fiéis que enchiam a Praça de S. Pedro. É cedo para fazer um balanço do pontificado deste homem simples, humilde que tem como prioridade lutar pelos desfavorecidos da vida e fazer regressar a Igreja à sua pureza e simplicidade original. Francisco quer uma Igreja menos pomposa, mais modesta na forma, mas mais ambiciosa nos objectivos. Francisco quer uma Igreja com uma maior preocupação social mais de acordo com a imagem de Jesus. Terá que ultrapassar muitos obstáculos, terá que superar o conservadorismo de muitos para implementar todas as reformas que ele pensa serem necessárias e urgentes para renovar a Igreja de Cristo aproximando-a mais dos ensinamentos do Mestre. Será uma tarefa hercúlea mas confiamos que Deus não lhe faltará com a sua ajuda para levar a sua missão a bom termo.

Termino com uma conclusão muito pessoal. S. João XXIII mudou a Igreja, S. João Paulo II mudou o mundo e o Papa Francisco irá certamente mudar o homem. De permeio João Paulo I encantou-nos a todos com o seu sorriso e não teve tempo para mais.


Guilherme Duarte.

(Artigo publicado no número de Junho de 2014 do jornal Cruz Alta)

quarta-feira, 7 de maio de 2014

MAIO, O MAIS BELO MÊS DO ANO

                                                         
                                 
“Andava um dia
 Em pequenino
 Nos arredores de Nazaré
 Em companhia de S. José
 O Deus Menino
 O Bom Jesus/…..”.

É assim que começa um poema que decerto nos faz regressar, com uma pontinha de saudade, aos longínquos tempos da nossa meninice. Este foi, para mim e para todas as pessoas da minha geração o primeiro contacto que tivemos com a poesia. É com este poema carregado de ternura que João de Deus termina a inesquecível Cartilha Maternal através da qual nos ensinou as primeiras letras, a juntá-las e a conseguir soletrá-las. Em suma, foi nessa cartilha, diria que mágica, que aprendemos a ler. João de Deus, no final da cartilha e sabendo-nos já aptos para a leitura, ainda que algo incipiente naquela idade, decidiu encantar-nos com um poema de uma ternura, uma simplicidade e uma ingenuidade tão grandes que o tornam verdadeiramente cativante; ao ponto de ser impossível esquecê-lo ao longo de toda a nossa vida. O ”Hino de Amor”, assim se intitula o poema, e a maravilhosa “Balada da Neve” de Augusto Gil que o livro da 2ª classe nos oferece, despertaram em muitos de nós, os mais velhos, o gosto pela poesia. Não é porém de poesia que pretendo falar este mês. Talvez numa próxima ocasião.  Esta referência ao poema de João de Deus veio-me à lembrança a propósito do mês de Maio, para mim o mais bonito mês do ano. Maio, o mês de Maria, o mês da mãe e também o mês das flores, dos aromas inebriantes e das melodias irreverentes do alegre trinar da passarada.

Terá sido por acaso que Nossa Senhora escolheu o mês de Maio para aparecer aos pastorinhos na Cova da Iria, num descampado, nessa altura certamente coberto por um manto multicolorido de flores campestres a rodear as azinheiras? Nossa Senhora fez a sua primeira aparição no mês de Maio e sinto que não fez por acaso. È enternecedora e muito bonita a associação da nossa Mãe do Céu à nossa mãe terrena num cenário florido, policromo e odoroso. Será possível imaginar algo mais encantador? Para mim, não. Já nos tempos de seminarista no mês de Maio enfeitava a minha mesa de estudo com uma pequena imagem de Nossa Senhora, uma fotografia da minha mãe, que nasceu no mês de Maio, e um pequeno ramo de flores campestres que colhia durante os passeios semanais das quintas-feiras. Já nessa altura, no início da minha adolescência Maio era, e é ainda hoje, um mês que me encanta
.
Mas que terá tudo isto a ver com o poema de João de Deus que referi no início desta conversa? Vou tentar explicar. Estamos no mês da Maria, o mês de Nossa Senhora, a Mãe extremosa de Jesus e esposa dedicada de S. José. Celebrando a Virgem temos que recordar também Jesus, não só O Jesus, Filho de Deus durante a sua vida pública mas também O Jesus que se fez homem, que foi criança e que como qualquer outra criança cresceu no seio de uma família que o amava, que o acarinhava, que brincava e passeava com Ele. Não podemos celebrar Maria sem celebrar também a Sagrada Família. João de Deus descreve no seu poema Jesus ainda menino a passear pelos campos na companhia de S. José. O poeta dá-nos o mote, cabe-nos a nós completar o quadro. Quanto a mim vejo Jesus a brincar e a saltar pelo campo sob o olhar atento e carinhoso de S. José, num intervalo do seu trabalho na carpintaria, enquanto em casa Nossa Senhora prepara a refeição para a família. Bondoso e sensível Jesus defende o rouxinol do ataque da serpente traiçoeira e a avezinha, grata pela ajuda e protecção do Menino não mais deixou de agradecer e louvar o seu protector através da melodia do seu canto maravilhoso.

Pouco mais de uma semana após termos meditado na Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus e contemplado a dor de Nossa Senhora ao pés da cruz a receber nos seus braços o corpo inerte do seu amado Filho, vamos agora venerá-la como a Mãe amantíssima de um Deus feito criança, uma criança alegre, obediente e generosa que passeia pelos campos de Nazaré pela mão de São José, enquanto Maria anda atarefada na lida da casa. Nossa Senhora há-de apreciar de certeza que a celebremos juntamente com o seu Divino Filho e com S. José o seu santo esposo. Maio é o mês de Maria, o mês da mãe e das flores mas é também o mês da Família Sagrada. Louvemo-La.

Guilherme Duarte

(Artigo publicado no número de Maio de 2014 no jornal Cruz Alta)


segunda-feira, 5 de maio de 2014

TEMPOS DE BORRASCA AMEAÇAM O FUTURO DOS PORTUGUESES



Os portugueses têm vindo a ser quase diariamente bombardeados com notícias que não prenunciam nada de bom para o futuro do nosso país nem do nosso povo. Os portugueses estão preocupados e temem pelo seu futuro, pelo futuro dos seus filhos e dos seus netos. Adensam-se nuvens muito negras sobre o povo português que tem vindo a ser recentemente esbulhado de muitos dos direitos adquiridos ao longo de muitos anos de trabalho, direitos esses considerados sagrados desde há muito  por governos, sindicatos e patrões. Num ápice tudo agora foi deitado por terra. Actualmente governa-se em Portugal contra o povo e não em prol do povo como é obrigação de qualquer governo eleito democraticamente. Os portugueses da classe média e das classes mais desfavorecidas têm sido o alvo preferencial das medidas de austeridade adoptadas sem um mínimo de sensibilidade social e já atingiram o limite das suas capacidades para suportar mais ataques à sua bolsa e os sacrifícios que lhes continuam a ser exigidos. O anunciado aumento de impostos e cortes nos salários e nas pensões que o governo se prepara para impôr no próximo ano aos portugueses vai lançar milhares de famílias na pobreza e muitas mesmo na mais dolorosa e humilhante das misérias. Não tenhamos medo de usar palavras duras quando elas traduzem fielmente a dureza das medidas que se aproximam.

Perante as notícias que correm, os portugueses desesperam e interrogam-se inquietos sobre o lhes reservará o futuro. Não será muito difícil prever o que aí vem já em 2013. Mais desemprego, aumento brutal, selvático mesmo, dos impostos, cortes significativos nos salários, nas pensões, nos subsídios e no apoio social do Estado, redução das verbas para a saúde e para a educação entre tantas outras “malfeitorias” que se adivinham. Mais uns milhares de concidadãos nossos ver-se-ão obrigados a entregar as suas casas aos bancos por não conseguirem pagar os empréstimos. A solução para muitos deles poderá ser a rua, um papelão a servir de enxerga e um monte de páginas de jornais velhos como cobertores, estendidos debaixo de uma ponte qualquer, num banco de jardim ou num vão de escada de um prédio abandonado e em ruínas. Haverá, que ninguém duvide, uma procura cada vez maior dos refeitórios sociais. É o regresso à “sopa do Sidónio” muito popular nos primórdios da primeira república. É um retrocesso de cerca de 100 anos. Bem podem estar orgulhosos os “pseudo-democratas” que lançaram este país na penúria e que agora contemplam a sua obra à distância, bem instalados na vida, seja em França, em Angola ou em qualquer outro país desde que seja bem longe de Portugal. Apesar do mal que nos fizeram e porque não sou vingativo, deixo-lhes um conselho, afastem-se da Islândia porque eles por lá têm o mau hábito de julgar e punir os responsáveis por quem delapida as finanças e a economia do país. Um mau exemplo, decerto.
 
É este futuro negro que espera os portugueses se entretanto o governo não arrepiar caminho e fazer aquilo que é a sua obrigação, defender o povo que o elegeu, principalmente os cidadãos mais carenciados. É imperioso bater o pé à “Troika” e dar  prioridade absoluta ás questões sociais e á recuperação da economia. O Estado Social tem que ser defendido a todo o custo e a Igreja já se pronunciou claramente nesse sentido. A dignidade das pessoas, a defesa intransigente dos direitos e do bem-estar das crianças, dos idosos e dos doentes não são negociáveis e têm que ser salvaguardadas sem reservas. Perguntamo-nos como foi possível que o nosso país tenha chegado a esta situação desesperada em que se encontra. A resposta é fácil e óbvia. Chegámos a este ponto por culpa de políticos incompetentes e irresponsáveis que delapidaram os dinheiros públicos em mordomias escandalosas, em gastos sumptuosos, em compadrios e favorecimento de amigos e correlegionários, em reformas chorudas obtidas após uma mera dúzia de anos de permanência em cargos políticos. Há mais de uma década nas mãos de uma geração de políticos impreparados que optaram por se filiarem nas juventudes partidárias onde aprenderam a arte da demagogia e da mentira e as manhas da politiquice em vez de apostarem no enriquecimento intelectual, na aquisição de conhecimentos sólidos baseados no saber científico que apenas se adquire nas universidades a sério, o país tinha inevitavelmente de se ressentir da má qualidade dos seus dirigentes políticos que parecem mais interessados no usufruto dos benefícios pessoais que a política lhes proporciona do que em servir o povo que lhes paga generosos ordenados, subsídios, cartões de crédito, automóveis topo de gama, viagens à volta do mundo e toda uma infinidade de privilégios e mordomias. Para eles não há cortes nos salários nem nos subsídios. Enquanto lançam para a pobreza e para a miséria alguns milhões de portugueses, estes políticos desumanos e insensíveis não abdicam de nenhum dos seus privilégios, O sofrimento do povo parece não os incomodar nem lhes tirar o sono. Solidariedade é uma palavra que desconhecem e afirmam com arrogância que lidam bem com a impopularidade. Curiosamente, enquanto estes políticos de segunda categoria impõem despoticamente ao povo sacrifícios que não aceitam para eles, dobram-se subservientes perante os poderosos que vindo do estrangeiro a pretexto de uma alegada ajuda apenas nos estão a destruir como país e como povo. Em contraponto com o autoritarismo que revelam dentro de portas perante um povo desmotivado e enfraquecido vergam-se vergonhosamente servis perante os senhores do mundo aceitando sem reagir todo o tipo de imposições gravosas para o povo que juraram defender..  
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Nuvens bem negras se adensam sobre o futuro de Portugal, o futuro que a geração dos políticos papagaios vão deixar como herança às gerações vindouras. Os portugueses têm todas as razões para se sentirem inquietos, deprimidos e revoltados. Como seria possível que não o estivessem quando engrossa diária e dramaticamente a legião dos desempregados?  Como queriam que se sentissem os portugueses que trabalharam uma vida inteira, sempre descontaram até ao último tostão tudo aquilo que o Estado lhes exigiu e que agora se vêm espoliados de parte significativa das suas pensões ganhas honestamente com o suor do seu rosto ao longo de uma vida de trabalho? Como querem que se sintam os portugueses quando diariamente ouvem os governantes e os seus fiéis arautos vir lamentar publica e despudoradamente que a esperança de vida em Portugal está a aumentar? Quererão ser incensados pelo povo aqueles que pensam que o ser humano é útil apenas enquanto tem uma vida activa, trabalha e desconta para os cofres do Estado mas que é descartável logo que se aposenta e passa a receber a reforma  a que tem direito para a qual ele contribuiu durante muitas décadas de trabalho?

George Orwel dá-nos conta no seu livro “O Triunfo dos Porcos” da existência de uma quinta onde há muito viviam  em perfeita harmonia várias espécies de animais. Um dia os porcos decidem tomar o poder nas suas mãos, mudam as regras a seu belo prazer, e determinam que a partir desse momento todos os animais da quinta são iguais mas que há uns que serão mais iguais do que outros. São os porcos, evidentemente. Portugal- parece-se cada vez mais com a quinta de que George Orwel nos fala. À luz da Constituição todos os portugueses são iguais nos seus direitos e nos seus deveres, mas a verdade é que há alguns que são mais iguais que outros. Basta ver quem são os que veem os seus rendimentos reduzidos por medidas infames e aqueles a quem essas medidas não se aplica. “O Triunfo dos Porcos”, mantém-se infelizmente bem actual. nos dias de hoje em Portugal..


Guilherme Duarte 

SER CRISTÃO TAMBÉM É SER SOLIDÁRIO

                    
Crise é a palavra que actualmente mais ouvimos pronunciar e que deprime e atormenta os nossos dias e a nossa estabilidade emocional. Portugal estará muito provavelmente a viver um dos momentos mais difíceis da sua história. Defendem-se os nossos políticos alegando que a crise que se vive no nosso país é um reflexo da crise generalizada que invade o mundo. Sê-lo-á sim, mas é também em grande parte culpa da incompetência das políticas irresponsáveis dos governos que temos tido, da corrupção que se faz sentir a todos os níveis, e do compadrio, mordomias e privilégios escandalosos de que os nossos políticos não abdicam. Após 1974 Portugal esteve já por três vezes à beira da bancarrota e pela terceira vez em 40 anos o FMI teve de intervir no nosso país para pôr ordem nas contas públicas sempre através de gravosas medidas de austeridade que penalizaram sempre as classes mais desfavorecidas da população portuguesa mas nunca essa austeridade e as medidas adoptadas foram tão brutais e desumanas para os trabalhadores e pensionistas e até para as classe mais desfavorecidas como estas que agora nos estão a ser impostas. Em Portugal vivem-se actualmente momentos dramáticos. Há cada vez mais pessoas a passar por graves dificuldades, o desemprego atingiu níveis impensáveis, a fome alastra e há cada vez mais famílias carenciadas muitas delas a viver em silêncio os seus dramas. Há pais que sofrem ao ouvir os filhos chorarem com fome sem terem um naco de pão para os alimentar. Há pessoas que ficaram sem um tecto por se terem visto obrigadas a devolver as suas casas aos bancos por não as puderem pagar, Há pais que já idosos têm sido o amparo dos filhos desempregados e que agora deixaram de os poder ajudar dados os constantes e criminosos cortes que lhes têm sido feito nas suas já exíguas pensões de reforma e de sobrevivência. Há cada vez um maior número de pessoas que deixaram de comprar os medicamentos que lhes indispensáveis para se tratarem por não os poderem pagar. A lista das dificuldades que afligem os portugueses é infindável e a sua enumeração completa não caberia no espaço destinado a esta rubrica. A constituição da república garante aos portugueses o direito ao pão, ao trabalho, à saúde, à educação, à habitação, à justiça e à equidade de tratamento mas esses direitos não passam de meras intenções que nenhum governo faz questão de cumprir.

O povo português vive momentos dramáticos. Os pobres estão cada vez mais pobres, a classe média está em vias de extinção mas paradoxalmente os ricos estão cada vez mais ricos. São sempre os poderosos que beneficiam das crises e são sempre os mais desfavorecidos que são obrigados a pagá-las..Não é só no domínio da economia e finanças que a crise se sente, há também uma crise de valores que é a mãe de todas as crises. Vivemos num mundo em que impera o egoísmo, a corrupção, a injustiça, a prepotência, a imoralidade, a ambição desmedida, a violência, a falta de sentimentos e de vergonha, a marginalidade, o individualismo, a desumanidade, a intolerância e o despotismo. O homem desumanizou-se e está a afastar-se cada vez mais dos valores cristãos que se baseiam no amor a Deus e ao próximo e que nos ensinam a ser solidários com quem precisa da nossa ajuda. O homem virou as costas à mensagem de Cristo, isolou-se, olha apenas para o seu próprio umbigo e ignora o seu semelhante. Cada um que se cuide e trate da sua vidinha que eu vou tratando da minha, é o princípio que rege cada vez um maior número de pessoas. Perante cenário tão negro somos levados a pensar que o mundo está perdido e não tem solução mas talvez ainda haja uma esperança de aos poucos se ir revertendo esta situação se atentarmos nalguns exemplos de solidariedade e amor ao próximo que nos vão chegando aqui e além. Exemplos como aquele que referi nesta coluna num dos últimos números do nosso jornal ao divulgar a existência de um grupo de pessoas da nossa comunidade que se uniram para ajudar famílias vizinhas que passam por graves dificuldades económicas que afectam também crianças a sofrer o drama da fome. Recebi recentemente um email de um amigo que integra esse grupo, que se autodenomina como “abelhinhas ajudantes” e que teve a gentileza de me informar que após a publicação desse artigo algumas outras “abelhinhas” se juntaram a esse grupo para contribuírem também com a sua ajuda. Informou-me ainda que neste último Natal todas as famílias que estão a ser apoiadas por eles receberam cabazes de Natal oferecidos pelo Rotary Clube de Sintra, que houve bolo-rei em todas as casas e todas as crianças tiveram os seus presentes. Será que não haverá esperança para o mundo quando ainda existem pessoas assim com tão elevado sentido de solidariedade e amor ao próximo? Quero acreditar que sim.

Mais recentemente, no seio da nossa UPS, um novo exemplo de solidariedade iluminou a nossa comunidade. Uma irmã nossa foi atingida por uma doença que a lançou para a cama de um hospital onde durante vários dias lutou pela sua vida que esteve gravemente ameaçada. Perante a aflição da família e os seus apelos à oração para que, nas palavras da mãe, acontecesse um milagre, um numeroso número de fiéis uniu-se à família da doente na igreja de S. Miguel para numa vigília de oração orarem em conjunto perante o Santíssimo Sacramento pela total recuperação da nossa irmã enferma. A intervenção divina aliada à dedicação e competência dos médicos e à determinação da doente operaram o tal milagre que a trouxe de volta à sua casa de regresso ao seio da sua família. São exemplos destes que nos fazem acreditar que o homem ainda é recuperável e a construção de uma sociedade melhor, mais justa e solidária ainda é viável. Assim todos queiramos.

Guilherme Duarte


(Artigo publicado no número de Fevº de 2014 no jornal Cruz Alta)

sábado, 3 de maio de 2014

DIVAGAÇÃO SOBRE OS "MEDIA"

                

Um artigo recentemente publicado no nosso jornal causou um certo desconforto a alguns dos nossos leitores. Não vou referir qual o artigo em questão porque não considero que seja benéfico para ninguém ressuscitar a polémica mas tenho que admitir que esse texto teve consequências, não direi que graves, mas desagradáveis. Quanto a mim, que confesso ter ficado também um pouco incomodado com o seu teor, levou-me a reflectir sobre a responsabilidade que recai sobre os ombros de quem escreve em órgãos da comunicação social por muito modestos que eles sejam, como é o nosso caso. Todos nós que escrevemos para o público somos tentados muitas vezes a veicular as nossas opiniões pessoais como se tratassem de verdades incontestáveis. Manifestar livremente as nossas opiniões é um direito que todos temos, partilhá-las com os nossos leitores considero que é saudável e útil porque promove o debate de ideias, mas querer fazê-las passar como realidades absolutas já não é, quanto a mim, uma atitude séria nem responsável e é eticamente reprovável.

Os ecos que me chegaram aos ouvidos sobre a reacção de algumas pessoas ao teor desse artigo, as dúvidas e inseguranças que ele provocou em alguns leitores e que me foram pessoalmente transmitidas pelos próprios, soaram em mim como um toque de alarme que me fizeram sentir a necessidade de parar para fazer um profundo exame de consciência. Eu sei que por vezes sou polémico, tenho o coração ao pé da boca e que não consigo controlar a minha indignação perante actos de desonestidade, de injustiça e de prepotência. Abomino a mentira e a corrupção e também não alinho em fundamentalismos de qualquer espécie. A questão que me pus foi muito simples. Será que alguma vez terei exagerado nas minhas críticas mais contundentes? Será ainda que aqui e além não terei ferido a susceptibilidade de alguns leitores ao dar voz neste jornal à minha indignação? É verdade que sempre fui honesto em tudo quanto tenho escrito como, graças a Deus, sempre pautei a minha vida em padrões elevados de honestidade que me foram transmitidos a partir do berço. Se de alguma coisa me posso orgulhar na vida é de ter sido sempre um homem honesto e honrado e não era a possibilidade que me é concedida de escrever neste nosso jornal que me iria fazer renegar os meus princípios.

Já aqui afirmei uma vez que o que se exige à comunicação social, na minha modesta opinião, é que privilegie a informação, mas uma informação isenta, objectiva, completa e verdadeira, sem submissões ao poder político ou a interesses económicos. Ao jornalista, ou ao articulista, exige-se independência, rigor, honestidade e competência. Quem transmite a notícia ou a informação deve dominar perfeitamente o tema que está a tratar para não correr o risco de induzir em erro o leitor, o ouvinte ou o espectador. Infelizmente nem sempre isso acontece como todos nós sabemos. Também se exige moderação aos órgãos da imprensa escrita ou falada que não devem promover a instabilidade, a dúvida, a depressão e a angústia. As televisões estão cada vez mais apostadas no “espectáculo” da informação. Telejornais a toda a hora, longos, repetitivos e muitas vezes a abordar assuntos sem o menor interesse e outros que já foram abordados variadíssimas vezes. Recordo-me que os portugueses, no tempo do Estado Novo, chamavam aos telejornais da RTP, a estação única na altura, de a “Telepastilha”, As coisas hoje não estão muito diferentes, os telejornais podem não ser já “telepastilhas”, mas são infindáveis “pastelões” com a duração de uma hora e meia a duas horas para repetirem duas, três e quatro vezes as mesmas notícias e as mesmas reportagens. Na perspectiva das direcções de informação o que é preciso é encher tempo. É uma autêntica dose para cavalo. Na minha opinião, evidentemente.

As conversas são como as cerejas e como já vem sendo habitual já me pus a divagar. Voltando ao tema inicial desta conversa quero deixar bem claro que quem escreve para um universo de leitores heterogéneo de várias idades, com interesses, cultura e instrução diferentes, com são os nossos deve ter muito cuidado para não ferir a suceptibilidade de ninguém e para que em vez de informar não se vá dar o caso de estarmos a espalhar a confusão, a dúvida e a insegurança. Esta situação desagradável a que me referi no início do artigo, teve pelo menos, no que me diz respeito, a virtude de me consciencializar ainda mais da responsabilidade que tenho ao escrever para si caro leitor. Se alguma vez não concordar com o que escrevo não hesite em manifestar-me a sua discordância. É para esse efeito que divulgo aqui o meu endereço de email. Se preferir fazê-lo pessoalmente creia que terei todo o prazer em conversar consigo.


Guilherme Duarte

(Artigo publicado no jornal Cruz Alta em Junho de 2013)

sexta-feira, 2 de maio de 2014

SEREMOS NÓS CRISTÃOS DE VERDADE?

                          

Confesso que muitas das coisas que acontecem à minha volta me passam completamente ao lado sem que eu me aperceba delas. Há quem diga que sou distraído, que vivo na Lua, que sou desinteressado. Têm alguma razão as pessoas que assim pensam a meu respeito mas não a terão totalmente. Sou distraído sim e viajo frequentemente por paragens longínquas sem sequer sair de casa, mas desinteressado? Só para aquilo que não me interessa e não me diz nada como por exemplo a intriga, os mexericos, a maledicência, a vingança, a intolerância e comportamentos afins que nada têm a ver com a minha maneira de estar na vida. Este meu distanciamento em relação a este tipo de atitudes e a repulsa que elas me causam levam a que por vezes eu seja surpreendido por factos que são já do conhecimento geral mas que eu desconheço de todo. Foi o que aconteceu agora com a notícia inesperada da próxima saída do padre António Ramires para a paróquia de Belas apenas seis anos após ter chegado à nossa UPS. Estranhei esta permanência tão curta do P. Ramires em Sintra dado que não é vulgar um pároco ficar tão pouco tempo numa paróquia, a não ser que haja motivos fortes que justifiquem a mudança. Um amigo que muito prezo e que não é nada dado ao “diz-se, diz-se” esclareceu-me que foi o próprio padre Ramires que solicitou a sua transferência e explicou-me por alto os motivos que teriam estado na base dessa sua decisão.

Apesar de ter ficado indignado com o relato que me foi feito e com a mesquinhez e a intolerância revelada por quem se intitula cristão e toma atitudes que de cristãs não têm nada, tinha decidido não abordar este tema nas páginas do nosso jornal mas, pensando melhor, achei que não devia calar o que me vai na alma e decidi dar voz à frontalidade que sempre me caracterizou e que não me deixa ficar calado quando a justiça é atropelada. Não vou, obviamente, entrar em pormenores nem apontar o dedo a ninguém, nem saberia a quem o fazer mesmo que tivesse essa intenção, mas vou lançar um desafio aos nossos leitores, principalmente àqueles cuja consciência possa estar um tanto ou quanto pesada, e que serão muito poucos, calculo eu. Somos uma comunidade cristã que deve seguir os ensinamentos de Cristo que entre muitas outras coisas nos incentiva a amar o próximo como a nós mesmos. Amar o próximo não é hostilizá-lo nem tentar afastá-lo do nosso convívio. Amar o próximo é ser solidário com ele, ajudando-o e apoiando-o, sendo sempre leais e sinceros. Não teremos que estar sempre de acordo com ele nem com as decisões que toma mas temos a obrigação de dialogarmos, olhos nos olhos, expondo as razões de queixa que pensamos ter, mas estando sempre dispostos também a ouvir. Criticar nas costas é feio e fazer queixinhas é uma atitude própria de crianças e nunca de pessoas adultas que pretendem ser respeitadas e levadas a sério.

O desafio que lanço é muito simples. Sugiro que olhemos para dentro de nós com sinceridade e questionemo-nos se somos assim tão bons cristãos como nos julgamos? Uma esmagadora maioria da nossa comunidade sê-lo-á com toda a certeza. Quanto a mim confesso desde já que estou muito longe de o ser mas maledicência e hipocrisia não fazem parte dos meus hábitos comportamentais. Desses pecados não tenho que me penitenciar. Sou intolerante? Sou sim senhor, mas apenas com comportamentos que desrespeitem e prejudiquem deliberadamente outras pessoas como parece ter sido o caso agora em questão. Aconselho, se é que me permitem que o faça, a alguns dos nossos irmãos que tal como eu não serão assim cristãos tão perfeitos e exemplares que façam um exame de consciência. O que nos falta para sermos cristãos a sério? Ir à igreja todos os domingos, (ou sábados), para ASSISTIR, à missa não é o suficiente..Não podemos ser cristãos apenas uma hora por semana mas sim todos os dias e a todas as horas. Jesus ensina-nos a ser caridosos, bondosos, solidários, honestos e tolerantes. O cristão não deve hostilizar ou segregar ninguém. Não pode ser vingativo nem intolerante. E ser queixinhas também não.

Amar o próximo como a nós mesmos é o caminho que Jesus nos desafia a trilhar. Comecemos por aí.

NOTA DO AUTOR: Peço desculpa à esmagadora maioria dos nossos leitores que não têm nada a ver com os factos que ocorreram recentemente no seio da nossa comunidade ed que motivaram este desabafo. Graças a Deus são muitos os irmãos nossos que são verdadeiros exemplos de conduta cristã, para todos nós.
Aos padres António e Raimundo que estão agora de partida para pastorear outro rebanho noutras paragens desejo as maiores felicidades. Que Deus nunca lhes falte com a sua graça e o seu apoio.


Guilherme Duarte

(Texto publicado no jornal Cruz Alta de Julho 2013)

PS:  Alguns dos textos que aqui coloco estão desfazados no tempo e não fazem agora muito sentido, mas por motivos que muitos dos meus amigos conhecem tive de anular todos os blogues que tinha há anos e estou agora a tentar refaze-los, na medida do possível

quinta-feira, 1 de maio de 2014

INFORMAR OU FAZER OPINIÃO?

Desde criança que me habituei a olhar com atenção para tudo o que me rodeia. Não consigo viver alheado do mundo, nem das pessoas, embora cada vez goste menos daquilo que ouço e observo. Podia assobiar para o lado, olhar para o ar e ignorar toda a “porcaria” com que diariamente me cruzo? Podia, mas não sou capaz. Por isso me irrito e revolto tantas vezes e por tantos motivos. É certo que sou intolerante com comportamentos incivilizados e faltas de educação e de respeito, mas sou saloio e como saloio que me prezo de ser, não consigo, nem quero, ser dissimulado nem hipócrita. Se alguma qualidade os saloios têm, e têm muitas, uma delas é a da franqueza e da frontalidade.
Já me desviei um pouco do tema da minha conversa de hoje que tem a ver com a necessidade que todos nós devemos sentir de reservarmos diariamente alguns minutos para dedicarmos à reflexão, mas este é também um espaço aberto à divagação. Não estranhe o leitor se, como se  diz popularmente, eu comece estas conversas a falar “em alhos para acabar a falar em bogalhos”. Não vejo qualquer incoveniente nesta dispersão do pensamento desde que siga uma linha lógica de raciocínio.  Como disse ao começar esta conversa, sou um observador atento do mundo em que vivo e quer-me parecer que anda por aí um mal que se tem vindo a propagar quase sem darmos por isso, chama-se preguiça mental e é provocada em grande parte pelo ritmo alucinante que a vida actualmente nos impõe. O acto de pensar e reflectir é um exercício fundamental para exercitar a nossa agilidade mental e a inteligência e impedi-la de ficar preguiçosa. É verdade que há demasiadas solicitações no nosso dia a dia que nos ocupam tempo, nos distraiem e nos fazem esquecer a necessidade de pensar.  Pensar ocupa tempo e exige concentração. Pensar dá trabalho, mas é um trabalho que nos valoriza, que nos faz crescer, dá-nos uma maior capacidade de análise, fortalece as nossas convicções e torna-nos mais confiantes e mais seguros para defendermos os nossos valores e os nossos ideais e torna-nos ainda menos vulneráveis a ideias e formas de pensar diferentes das nossas com que tantas vezes somos confrontados e que nos pretendem impôr..  
Quando nos recusamos a seguir a opinião alheia que nada tem a ver com a nossa e mantemos com firmeza a nossa própria opinião é frequente atirarem-nos à cara com a célebre frase de que “só os burros é que não mudam”. Eu costumo responder a este argumento falacioso e ofensivo afirmando que burro será quem muda de opinião sem um fundamento sólido e só porque os outros querem. Deus deu-nos a faculdade de pensar e a inteligência, para podermos ser livres e tomarmos as nossas próprias decisões e não para que deixemos que os outros pensem por nós. Claro que as podemos mudar mas sempre como resultado inequívoco do nosso pensar, do nosso sentir, do nosso raciocínio e clarividência, e nunca porque os outros nos querem obrigar a fazê-lo.
 Vem esta conversa a propósito de uma campanha lançada pelos responsáveis pelo jornal “Expresso” para publicitar a comemoração do seu quadragésimo aniversário. Afirmam eles com orgulho que há quarenta anos que o “Expresso” anda a FAZER a opinião dos portugueses. Incomoda-me esta afirmação e incomoda-me mais ainda porque penso que existe nela alguma ponta de verdade. Acredito que há uma percentagem significativa de portugueses cujas opiniões sobre política e sobre muitas outras matérias não são mais que um “upload” das opiniões dos comentadores que lêm nos jornais ou ouvem nas televisões. Tomam por verdades absolutas todas as afirmações feitas pelos vários jornalistas e comentadores sem muitas vezes saberem quem eles são, que qualificações têm, que ideologia defendem e quais os interesses que os movem. Na vida nem tudo é tão claro nem tão inocente como nos querem fazer crer.

Considero esta frase publicitária do jornal “Expresso” um atestado de menoridade aos seus leitores. Eu nunca permiti, nem  permitirei que a minha opinião seja FEITA  por nenhum orgão de comunicação social nem por nenhum jornalista ou comentador. Dos orgãos de comunicação social exijo apenas informação rigorosa, séria e verdadeira, que me habilite a ser eu a FAZER a minha própria opinião, direito de que não prescindo e que não delego em ninguém. É que como já disse, sou saloio, e se algum defeito os saloios têm, e terão talvez um ou outro, é o de serem desconfiados. É que, eles são saloios mas não são parvos.


Guilherme Duarte

(Artigo publicado no número de Fevº de 2013 do jornal Cruz Alta)

quarta-feira, 30 de abril de 2014

ABRIU A CAÇA AO IDOSO


                                                                               
                                                                                        
A população mais idosa está na mira dos governantes do nosso país e está na mira, não porque estes estejam preocupados com o seu bem estar e empenhados em proporcionar-lhes uma velhice digna, confortável e com a qualidade que merecem mas porque, para eles, os idosos, não passam de um empecilho e um encargo insuportável para os cofres do Estado. Para falar mais claro, os idosos são, para quem nos governa,   uns  parasitas que nada fazem e que vivem à custa do erário público sem terem para o país qualquer espécie de utilidade. É assim que os nossos governantes pensam embora não o digam claramente mas as medidas gravosas que têm vindo sucessivamente a tomar e que penalizam sempre os idosos revelam aquilo que eles tentam esconder. O Primeiro-Ministro afirmou recentemente que os reformados e pensionistas em Portugal não pagaram o suficiente para terem direito às reformas que recebem. Tem razão o nosso primeiro que pecou apenas por generalizar e não ter identificado inequivocamente a quem se estava a referir. Há de facto muita gente em Portugal a receber reformas imerecidas porque não trabalharam nem pagaram o suficiente para as justificar, mas esses não são certamente os trabalhadores que após uma vida inteira de trabalho e de terem contribuído para criar riqueza para o nosso país, só têm direito a reformar-se aos 65 anos trazendo consigo, na grande maioria dos casos, pensões que mal chegam para garantir a sua subsistência. O Primeiro-Ministro quereria certamente referir-se àqueles senhores privilegiados que após doze anos no exercício de cargos políticos passam a ter direito a receber uma apreciável pensão de reforma, qualquer que seja a sua idade e mesmo que nada de relevante tenham feito em prol da nação durante os seus mandatos.

A verdade é que de há uns tempos a esta parte temos vindo a ouvir frequentemente da  boca de membros do governo,  ou de alguns dos seus fiéis arautos, que a esperança de vida dos portugueses tem vindo a aumentar. Não haveria nada de mal nessas afirmações se não descortinássemos nelas uma boa dose de lamúria. Quando se esperaria que os nossos governantes se regozijassem com o progresso da ciência médica e aproveitassem essa realidade para destacarem o sucesso da política de saúde do nosso país, ainda que com alguma demagogia à mistura,  pelo contrário, sentem-se tão incomodados com esse facto que chegam a esquecer a decência e o sentido de humanidade e da vergonha permitindo-se o desplante de vir publicamente lamentar-se por os portugueses estarem a viver tempo demais. O país ouve e fica estupefacto. 

Para esta nova geração de, ( péssimos), políticos desprovidos de coração, que pouco ou nada fizeram de útil na vida, sem o mínimo de sensibilidade social e de respeito pelo povo que os elegeu, o direito à vida está dependente de uma mera avaliação contabilística. Para estes aprendizes de políticos, incompetentes e desumanos, o raciocínio é muito simples; se  dás lucro ao Estado podes viver, se apenas és um encargo e dás despesa, então vê se morres rapidamente. Esta forma de pensar e fazer política é tremendamente cruel e exala um acentuado fedor neonazi..

Esta hostilidade contra os idosos, para além de injusta é também estúpida e cruel. Cresce no cérebro minúsculo de alguns dos nossos políticos  a ideia que os idosos são perniciosos para o Estado e constituem um fardo tão dispendioso que seria conveniente para o país que não vivessem tanto tempo. Quem alimenta na sua cabeça tais ideias, ou é criminoso ou sofre de algum distúrbio mental grave a requerer tratamento urgente. Perante esta nova mentalidade, a palavra que imediatamente me ocorre para qualificar estas ideias perversas é apenas uma: EXTERMINAÇÃO. Dir-me-ão que é uma palavra demasiado violenta, mas se pensarmos bem e estivermos atentos a tudo o que esta gente diz e faz, teremos que concluir que não é uma palavra totalmente desadequada. Hitler era um louco, um alucinado que em vez de ter sido internado numa clínica psiquiátrica foi eleito para liderar e governar a Alemanha. Resultado? Uma guerra longa e sangrenta, a Europa arrasada e muitos milhões de mortos pelo caminho. Ficou demonstrado inequivocamente e de forma trágica, que é muito perigoso entregar um país nas mãos de loucos.

De quando em vez as televisões e o cinema, “para que o mundo não esqueça”, mostram-nos imagens dos campos de extermínio nazis como Auchewitz, Bikernau, Treblinka, Chelmno, Jasenovac entre outros, onde foram exterminados alguns milhões de judeus, apenas por serem judeus. As gerações mais antigas não esqueceram, nem poderiam esquecer, a barbaridade desses crimes, mas os mais novos, na sua maioria, talvez não saibam ou não estejam conscientes dos horrores vividos na Europa entre 1939 e 1945. Talvez desconheçam até o que foi o holocausto, e aqueles que sabem não acreditam que uma situação semelhante se possa vir a repetir nos dias de hoje. Estão redondamente enganados. Os holocaustos nunca deixaram de se praticar e, de diversas formas, continuam a existir um pouco por todo o mundo, basta que estejamos atentos aos noticiários para constatarmos que centenas de milhares de seres humanos continuam a morrer, vítimas da violência das muitas guerras e guerrilhas que proliferam por este mundo fora. Não podemos baixar a guarda e devemos permanecer sempre alerta para combater a tentativa de evitar que políticas que desrespeitem o homem e o seu direito à dignidade, à saúde e à vida, venham a ser adoptadas em Portugal. O perigo espreita. Os idosos estão em risco. Temos que estar muito atentos. A bandeira portuguesa ostenta orgulhosamente a esfera armilar, as cinco quinas e os sete castelos. Não queremos ver lá, um dia, também a cruz suástica.

Caros amigos, acreditem que eu não estou a delirar e garanto que me encontro no meu perfeito juízo. Tudo o que acabei de afirmar  pode parecer exagerado mas é fruto de uma observação atenta de tudo quanto vejo, do que leio e do que ouço. Mas que vi, li ou ouvi eu que me permita tirar semelhantes conclusões? Eu digo. Há dias li que o ministro das Finanças do novo governo japonês  afirmou publicamente que os idosos deviam morrer depressa para não constituírem um encargo para o Estado, (curiosamente o Japão foi no passado um aliado fiel de Hitler e da Alemanha nazi). Mas isso é no Japão, que temos nós a ver com isso? Temos e muito porque recentemente um deputado português escreveu num artigo que publicou num jornal, entre outras coisas, que Portugal está a ser “CONTAMINADO pela já conhecida PESTE GRISALHA e que o envelhecimento da população é “ASSUSTADOR porque provoca um aumento penoso dos encargos sociais com reformas, pensões e assistência médica”. A guerra ao idoso é que é a peste que devemos temer, uma peste tão contagiosa que num ápice saltou de Tóquio até Lisboa. Sr. deputado Carlos Peixoto, acautele-se porque os anos passam céleres e os cabelos embranquecem depressa. O seu irá embranquecer também, a menos que fique careca. Mas careca ou não, os anos ir-se-ão acumulando.Que deseja o senhor para si quando a “peste” da velhice lhe bater à porta?


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Guilherme Duarte