Crise é a palavra que
actualmente mais ouvimos pronunciar e que deprime e atormenta os nossos dias e
a nossa estabilidade emocional. Portugal estará muito provavelmente a viver um
dos momentos mais difíceis da sua história. Defendem-se os nossos políticos
alegando que a crise que se vive no nosso país é um reflexo da crise
generalizada que invade o mundo. Sê-lo-á sim, mas é também em grande parte
culpa da incompetência das políticas irresponsáveis dos governos que temos
tido, da corrupção que se faz sentir a todos os níveis, e do compadrio,
mordomias e privilégios escandalosos de que os nossos políticos não abdicam.
Após 1974 Portugal esteve já por três vezes à beira da bancarrota e pela
terceira vez em 40 anos o FMI teve de intervir no nosso país para pôr ordem nas
contas públicas sempre através de gravosas medidas de austeridade que
penalizaram sempre as classes mais desfavorecidas da população portuguesa mas
nunca essa austeridade e as medidas adoptadas foram tão brutais e desumanas
para os trabalhadores e pensionistas e até para as classe mais desfavorecidas como
estas que agora nos estão a ser impostas. Em Portugal vivem-se actualmente
momentos dramáticos. Há cada vez mais pessoas a passar por graves dificuldades,
o desemprego atingiu níveis impensáveis, a fome alastra e há cada vez mais
famílias carenciadas muitas delas a viver em silêncio os seus dramas. Há pais
que sofrem ao ouvir os filhos chorarem com fome sem terem um naco de pão para
os alimentar. Há pessoas que ficaram sem um tecto por se terem visto obrigadas
a devolver as suas casas aos bancos por não as puderem pagar, Há pais que já
idosos têm sido o amparo dos filhos desempregados e que agora deixaram de os
poder ajudar dados os constantes e criminosos cortes que lhes têm sido feito
nas suas já exíguas pensões de reforma e de sobrevivência. Há cada vez um maior
número de pessoas que deixaram de comprar os medicamentos que lhes
indispensáveis para se tratarem por não os poderem pagar. A lista das
dificuldades que afligem os portugueses é infindável e a sua enumeração
completa não caberia no espaço destinado a esta rubrica. A constituição da
república garante aos portugueses o direito ao pão, ao trabalho, à saúde, à
educação, à habitação, à justiça e à equidade de tratamento mas esses direitos
não passam de meras intenções que nenhum governo faz questão de cumprir.
O povo português vive
momentos dramáticos. Os pobres estão cada vez mais pobres, a classe média está
em vias de extinção mas paradoxalmente os ricos estão cada vez mais ricos. São
sempre os poderosos que beneficiam das crises e são sempre os mais
desfavorecidos que são obrigados a pagá-las..Não é só no domínio da economia e
finanças que a crise se sente, há também uma crise de valores que é a mãe de
todas as crises. Vivemos num mundo em que impera o egoísmo, a corrupção, a
injustiça, a prepotência, a imoralidade, a ambição desmedida, a violência, a
falta de sentimentos e de vergonha, a marginalidade, o individualismo, a
desumanidade, a intolerância e o despotismo. O homem desumanizou-se e está a
afastar-se cada vez mais dos valores cristãos que se baseiam no amor a Deus e
ao próximo e que nos ensinam a ser solidários com quem precisa da nossa ajuda.
O homem virou as costas à mensagem de Cristo, isolou-se, olha apenas para o seu
próprio umbigo e ignora o seu semelhante. Cada um que se cuide e trate da sua
vidinha que eu vou tratando da minha, é o princípio que rege cada vez um maior
número de pessoas. Perante cenário tão negro somos levados a pensar que o mundo
está perdido e não tem solução mas talvez ainda haja uma esperança de aos
poucos se ir revertendo esta situação se atentarmos nalguns exemplos de
solidariedade e amor ao próximo que nos vão chegando aqui e além. Exemplos como
aquele que referi nesta coluna num dos últimos números do nosso jornal ao
divulgar a existência de um grupo de pessoas da nossa comunidade que se uniram
para ajudar famílias vizinhas que passam por graves dificuldades económicas que
afectam também crianças a sofrer o drama da fome. Recebi recentemente um email
de um amigo que integra esse grupo, que se autodenomina como “abelhinhas
ajudantes” e que teve a gentileza de me informar que após a publicação desse
artigo algumas outras “abelhinhas” se juntaram a esse grupo para contribuírem
também com a sua ajuda. Informou-me ainda que neste último Natal todas as
famílias que estão a ser apoiadas por eles receberam cabazes de Natal
oferecidos pelo Rotary Clube de Sintra, que houve bolo-rei em todas as casas e
todas as crianças tiveram os seus presentes. Será que não haverá esperança para
o mundo quando ainda existem pessoas assim com tão elevado sentido de
solidariedade e amor ao próximo? Quero acreditar que sim.
Mais recentemente, no seio
da nossa UPS, um novo exemplo de solidariedade iluminou a nossa comunidade. Uma
irmã nossa foi atingida por uma doença que a lançou para a cama de um hospital
onde durante vários dias lutou pela sua vida que esteve gravemente ameaçada.
Perante a aflição da família e os seus apelos à oração para que, nas palavras
da mãe, acontecesse um milagre, um numeroso número de fiéis uniu-se à família
da doente na igreja de S. Miguel para numa vigília de oração orarem em conjunto
perante o Santíssimo Sacramento pela total recuperação da nossa irmã enferma. A
intervenção divina aliada à dedicação e competência dos médicos e à
determinação da doente operaram o tal milagre que a trouxe de volta à sua casa
de regresso ao seio da sua família. São exemplos destes que nos fazem acreditar
que o homem ainda é recuperável e a construção de uma sociedade melhor, mais
justa e solidária ainda é viável. Assim todos queiramos.
Guilherme Duarte
(Artigo publicado no número de Fevº de 2014 no jornal Cruz Alta)
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