Desde
criança que me habituei a olhar com atenção para tudo o que me rodeia. Não consigo
viver alheado do mundo, nem das pessoas, embora cada vez goste menos daquilo
que ouço e observo. Podia assobiar para o lado, olhar para o ar e ignorar toda
a “porcaria” com que diariamente me cruzo? Podia, mas não sou capaz. Por isso
me irrito e revolto tantas vezes e por tantos motivos. É certo que sou
intolerante com comportamentos incivilizados e faltas de educação e de respeito,
mas sou saloio e como saloio que me prezo de ser, não consigo, nem quero, ser
dissimulado nem hipócrita. Se alguma qualidade os saloios têm, e têm muitas,
uma delas é a da franqueza e da frontalidade.
Já me desviei um pouco do
tema da minha conversa de hoje que tem a ver com a necessidade que todos nós
devemos sentir de reservarmos diariamente alguns minutos para dedicarmos à
reflexão, mas este é também um espaço aberto à divagação. Não estranhe o leitor
se, como se diz popularmente, eu comece estas
conversas a falar “em alhos para acabar a falar em bogalhos”. Não vejo qualquer
incoveniente nesta dispersão do pensamento desde que siga uma linha lógica de
raciocínio. Como disse ao começar esta
conversa, sou um observador atento do mundo em que vivo e quer-me parecer que
anda por aí um mal que se tem vindo a propagar quase sem darmos por isso, chama-se
preguiça mental e é provocada em grande parte pelo ritmo alucinante que a vida
actualmente nos impõe. O acto de pensar e reflectir é um exercício fundamental
para exercitar a nossa agilidade mental e a inteligência e impedi-la de ficar
preguiçosa. É verdade que há demasiadas solicitações no nosso dia a dia que nos
ocupam tempo, nos distraiem e nos fazem esquecer a necessidade de pensar. Pensar ocupa tempo e exige concentração. Pensar
dá trabalho, mas é um trabalho que nos valoriza, que nos faz crescer, dá-nos
uma maior capacidade de análise, fortalece as nossas convicções e torna-nos mais
confiantes e mais seguros para defendermos os nossos valores e os nossos ideais
e torna-nos ainda menos vulneráveis a ideias e formas de pensar diferentes das
nossas com que tantas vezes somos confrontados e que nos pretendem impôr..
Quando nos recusamos a
seguir a opinião alheia que nada tem a ver com a nossa e mantemos com firmeza a
nossa própria opinião é frequente atirarem-nos à cara com a célebre frase de que
“só os burros é que não mudam”. Eu costumo responder a este argumento falacioso
e ofensivo afirmando que burro será quem muda de opinião sem um fundamento
sólido e só porque os outros querem. Deus deu-nos a faculdade de pensar e a
inteligência, para podermos ser livres e tomarmos as nossas próprias decisões e
não para que deixemos que os outros pensem por nós. Claro que as podemos mudar mas
sempre como resultado inequívoco do nosso pensar, do nosso sentir, do nosso
raciocínio e clarividência, e nunca porque os outros nos querem obrigar a
fazê-lo.
Vem esta conversa a propósito de uma campanha
lançada pelos responsáveis pelo jornal “Expresso” para publicitar a comemoração
do seu quadragésimo aniversário. Afirmam eles com orgulho que há quarenta anos
que o “Expresso” anda a FAZER a opinião dos portugueses. Incomoda-me esta
afirmação e incomoda-me mais ainda porque penso que existe nela alguma ponta de
verdade. Acredito que há uma percentagem significativa de portugueses cujas
opiniões sobre política e sobre muitas outras matérias não são mais que um
“upload” das opiniões dos comentadores que lêm nos jornais ou ouvem nas
televisões. Tomam por verdades absolutas todas as afirmações feitas pelos
vários jornalistas e comentadores sem muitas vezes saberem quem eles são, que
qualificações têm, que ideologia defendem e quais os interesses que os movem.
Na vida nem tudo é tão claro nem tão inocente como nos querem fazer crer.
Considero esta frase
publicitária do jornal “Expresso” um atestado de menoridade aos seus leitores.
Eu nunca permiti, nem permitirei que a
minha opinião seja FEITA por nenhum
orgão de comunicação social nem por nenhum jornalista ou comentador. Dos orgãos
de comunicação social exijo apenas informação rigorosa, séria e verdadeira, que
me habilite a ser eu a FAZER a minha própria opinião, direito de que não
prescindo e que não delego em ninguém. É que como já disse, sou saloio, e se
algum defeito os saloios têm, e terão talvez um ou outro, é o de serem
desconfiados. É que, eles são saloios mas não são parvos.
Guilherme Duarte
(Artigo publicado no número de Fevº de 2013 do jornal Cruz Alta)
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