sábado, 28 de fevereiro de 2015

QUANDO O HORIZONTE SE ENCURTA

                      
Quando a idade e/ou a doença avançam encurta-se o horizonte e o caminho que nos falta percorrer na vida. Perante a ausência de perspectivas futuras temos a tendência de olhar para trás e deixar que os nossos pensamentos se estendam pela vastidão do passado e através das recordações voltar a percorrer o longo caminho já trilhado ao longo de muitos anos. Quando o futuro já pouco ou nada tem para nos oferecer e já não há tempo nem vontade para acalentar novos sonhos ou estabelecer objectivos, é no passado que nos refugiamos. Procuramos combater a angústia do presente recordando momentos felizes de antanho. Revisitamos enternecidos a nossa infância já tão longínqua, recordamos a ternura, o carinho e o amor que os nossos pais nos dispensaram, relembramos os nossos velhos brinquedos, as brincadeiras favoritas, o primeiro dia de escola, os professores que nos ajudaram a crescer no conhecimento e no saber, antigos colegas que perdemos de vista, uns devido a contingências da vida, outros porque que partiram prematuramente e já não estão entre nós. Nostálgicos, revivemos a infância dos nossos filhos e netos e deixamos que os olhos se nos humedeçam ao folhear os velhos álbuns de fotografias que nos levam a viajar no tempo e a reviver anos que se perderam já na poalha do tempo. As recordações e a saudade são o escudo atrás do qual nos defendemos do desespero causado pela nossa fragilidade e impotência para alterar o destino e vencer o inevitável.
O facto de ter estado a tecer estas considerações no plural não significa que eu pense que todos os idosos ou doentes se comportam desta forma. A verdade é que há quem seja capaz de viver a velhice com optimismo, com entusiamo e que não desista de acreditar no futuro e há também quem se recuse a deitar a toalha ao chão e lute denodadamente contra a doença por muito grave que ela seja. Gostaria muito de ser capaz de o fazer também mas a minha falta de coragem, direi mesmo que cobardia, conduz-me à desmotivação e ao fatalismo. Olho para a frente e só vejo nuvens negras sem vislumbrar um raiozinho de sol, por muito pequeno que seja, por isso sou daqueles que opta por olhar para trás, recordar o passado e deixar-me invadir pela saudade. Gostaria de percorrer o caminho que me falta, com paz e tranquilidade, e com a certeza que o futuro daqueles que amo e que irei deixar quando desaparecer no horizonte será risonho e tranquilo, mas a realidade é diferente e bem mais inquietante. Temos uma nação mergulhada numa crise profunda provocada por políticos incapazes, principescamente pagos para servir o país mas que, pelo contrário, apenas se preocuparam e preocupam em servir-se dele e beneficiar de regalias e privilégios verdadeiramente escandalosos. A corrupção e oportunismo de uns quantos, o enriquecimento ilícito de outros tantos e o empobrecimento progressivo do povo que tem vindo a ser sacrificado e espoliado dos seus direitos por governantes insensíveis e desprovidos de qualquer sentido de humanidade, um país falido e descredibilizado, um povo caído na pobreza e um futuro comprometido são a pesada herança desta geração de políticos de aviário.
Um país sem futuro, o drama do desemprego que a minha filha está a viver e a incerteza do futuro das minhas netas, não me permitirão percorrer o caminho que me falta e atravessar a linha do horizonte com a serenidade que desejava. Se Deus não vier em meu auxílio estarei condenado a fazê-lo invadido por uma tremenda angústia. Não é assim que eu gostaria de partir. Entretanto vou continuar a reviver o passado enquanto Deus o permitir.


Guilherme Duarte

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

SE NÓS QUISERMOS, NÓS PODEMOS

  
Dediquei o Foto-Comentário deste mês à CANAFERRIM – Associação Cívica e Cultural, recentemente criada com o obectivo de defender Sintra e colaborar com o poder autárquico no sentido de encontrar soluções para resolver os muitos problemas que afectam a nossa terra. Ao iniciar este artigo pensei que seria interessante recordar aos nossos leitores que também na nossa Unidade Pastoral existe uma associação cultural criada há poucos anos com a finalidade de fazer dela um instrumento dinamizador de realizações culturais e lúdicas que ajudem a difundir os valores cristãos no seio da nossa comunidade. Estou a referir-me à CRUZ ALTA – Associação Cultural Cristã de Sintra cuja direcção é presidida naturalmente pelo nosso pároco padre Armindo Reis.

Para utilizar um termo actualmente muito em voga esta associação foi pensada para ser mais uma ferramenta posta à disposição dos responsáveis da UPS para os ajudar nas diversas actividades ligadas à cultura e ao lazer. Responsável pela gestão do nosso jornal Cruz Alta, a associação está longe de ter conseguido alcançar todos os propósitos que estiveram na génese da sua criação. Esta afirmação poderá levar alguém a pensar que a “CRUZ ALTA – Associação Cultural Cristã de Sintra” é um projecto fracassado. Nada mais errado. Esta associação cultural não é um fracasso mas sim um sonho que não foi ainda cumprido na sua totalidade mas que o será se houver pessoas com ideias, com tempo e vontade que queiram ajudar a direcção a concretizar esse sonho. Acreditem que há muita coisa que pode ser feita. A nossa comunidade é numerosa e culturalmente rica. Existem de certeza inúmeras pessoas com muito talento nos vários ramos das artes, seja na música, na literatura, no canto, no desenho e pintura, na fotografia, na representação, no artesanato e em tantas outras manifestações artísticas. Se tivermos a felicidade de podermos contar com o apoio e a colaboração de todas essas pessoas tenho a certeza de que o sonho será cumprido e a associação poderá dar um contributo decisivo para divulgar tantos artistas desconhecidos e de valor que se encontram no meio de nós.

Exposições de pintura e fotografia, representações teatrais, actuação de conjuntos musicais, e grupos corais, projecção de filmes como já aconteceu num passado não muito longínquo, a dinamização da biblioteca que nunca funcionou, realização de rallyes paper, palestras sobre Sintra e a sua história e mais um sem número de iniciativas que iriam seguramente atrair a atenção da comunidade. Os almoços janela poderiam ser mais participados se a ele se seguissem algumas sessões de animação cultural o lúdica. As ideias existem, existe espaço mas falta o essencial, as pessoas com vontade de fazer algo de novo. A actual direcção, sozinha, pouco ou nada poderá fazer dado o número reduzido de pessoas que a integram e o trabalho que já têm em diversas actividades pastorais, isto para além da edição do jornal Cruz Alta que ocupa muito tempo à maioria dos directores da associação.

Devo dizer que ninguém me encomendou este sermão e não sei sequer se todos os meus colegas estarão de acordo com o que acabo de escrever mas este é um espaço onde me é permitido dar largas à minha imaginação, aos meus pensamentos e aos meus sonhos e foi assim que eu sonhei esta associação. Acredito que não estou sozinho nesse sonho, um sonho que é perfeitamente viável se todos estivermos interessados realizá-lo. Não haverá por aí artistas que se queiram mostrar ou pessoas com dinamismo e espírito de iniciativa? É evidente que tal como o trabalho da CANAFERRIM não terá resultados imediatos, também este sonho precisará de tempo para ser cumprido na sua totalidade. Se atrás deste sonho outros sonhos surgirem será sinal de que a nossa associação estará bem viva. Não há limites para sonhar. Nem para fazer. Não há limites para a criatividade, só para o querer..


Guilherme Duarte

(Artigo publicado na edição de FEvº 2015 do jornal Cruz Alta"